The science of sleep de Michel Gondry(2006)
Michel Gondry é um tipo que muita gente consideraria como "esquisito". Gajo todo geek, absolutamente uncool, acaba por virar estrela à pala de inovadores videoclips onde estilizava muitas das quase inverosímis ideias que andavam na cabeça dele. Como ele próprio diz, "eu que nunca fui cool, comecei a ser considerado como tal por causa dos videoclips".
E depois dos videoclips vieram os filmes: o razoável "Human nature", e o excelente "The eternal sunshine of the spotless mind", que o consagrou como um dos melhores realizadores desta nova geração.
"The science of sleep" é o projecto mais pessoal de gondry. Ao contrário dos dois filmes anteriores que contaram com a ajuda de Charlie Kaufman no argumento, desta feita ele próprio o fez. E acabou por relatar uma história sobre um tipo geek e uncool que vive num mundo altamente influenciado pelos sonhos, e que se apaixona pela vizinha sem fazer a mínima tenção disso.
No fundo, a personagem encarnada por Gael Garcia Bérnal,Sthéphane é o próprio gondry: e Charlotte Gainsbourg,Stéphanie, o objecto de seus desejos. E todos os sonhos da personagem principal, são as próprias concepções visuais que gondry sempre aplicara nos seus videoclips.
È nos sonhos que Stéphane atinge a máxima realização pessoal: tem o pseudo-programa de televisão que lhe permite reagir face a tudo. Aí ele tem atitude, diz aquilo que quer, arranja-se bem no emprego, papa as gajas, e o mais importante fica com a miúda no fim. E tudo isto em cenários absolutamente deliciosos, como aquela cidade feita em cartão, ou a água em papel celofane: tudo num registo animado, numa clara e curiosa homenagem aos desenhos animados europeus de há uns anos atrás.
È sobretudo na fisionomia dos sonhos, no delírio estético-visual que o filme ganha muita desenvoltura. Aquela desenvoltura que não tem no argumento, o que faz com que ele acabe por ter alguns repelões de vez em quando. No entanto esta acaba por ser uma falsa questão.
Até agora, o grande defeito que tem sido colocado a este filme, é precisamente a deficiência argumentativa. Sim, como já disse existem alguns repelões. O filme não é coerente a cem por cento, e muito menos um objecto absolutamente sólido.
Mas também não pretende ser isso. Se formalmente fosse algo mais estratificado e coeso, muita da espontaneidade dos sonhos de Stéphane ir-se-ia perder. Se aquela paixão pela vizinha fosse descrita de uma forma mais concreta, mais sólida e até mais credível, o filme perderia todo o sentido. È precisamente a força da paixão de Stéphane, e ao mesmo tempo a sua insegurança, que permitem a Gondry esquivar-se acontar uma história de uma forma um pouco mais sóbria, acabando por destilá-la em delírios visuais que deleitam qualquer um.
Este filme não é mais que um boy meets girl com um final minimamente aberto, se atentarmos a metade da coisa. Em relação à outra metade, tudo se concretiza da forma mais previsível. resta saber se estamos a viver o sonho, ou a realidade termos que Stéphane tem tanta dificuldade em distinguir.
"The science of sleep" não é uma obra maravilhosa nem excepcional como "The eternal sunshine of the spotless mind". Mas também não é o filme frágil como tanta gente o pinta. È um filme de uma ternura tocante, absorvido pelas ideias quase psicadélicas de gondry, que resultam em cheio quando transpostas para o grande ecrã.
8/10
1 Comments:
A ideia deste teu blog é interessante. :-)
Post a Comment
<< Home