Friday, June 09, 2006

Hard Candy de David Slade(2006)



"Ah e tal, os pedófilos são um bando de filhos da p**** cab*** do car****, e deviam ser enfiados em fornos para ficarem ali bem cozidinhos e darem alimento a alguém. claro que primeiro era cortar o c**** àqueles filhos da p*** metê-lo primeiro no forno, para eles de fora o verem ali a ser bem aquecidinho...e depois serem obrigados a comê-lo antes do verdadeiro assado". Nota: deixei as palavras pecaminosas com asteriscos porque há por aí povo muito sensível. mas para os insensíveis, onde se lê o primeiro p****, quer dizer "puta", o segundo e terceiro conjunto de asteriscos, tem escondido a palavra "cabrão" e "caralho", o quarto e o quinto, "caralho" e "puta". só para esclarecer os mais ingénuos...tipo putos de 14 anos com capuzes vermelhos.

Adiante: este é o pensamento maioritário da sociedade, em relação aos pedófilos. Pelo menos aquele tipo de povo mais desinformado, que não se coíbe de lançar alguém para a fogueira, não tendo em mente que, por mais repulsivo seja a pessoa, ela não deixa de ser isso mesmo: uma pessoa. E este fenómeno de total extremismo vai desde as peixeiras de matosinhos a altos empresários da sonae. Atravessa tudo e todos.
Agora, e se houvesse um filme onde o pedófilo fosse a vítima? Onde um pedófilo andasse no conversanço na net com uma qualquer pita (daqueles do "sabe-a toda), a levasse para casa e depois..bem depois ficasse preso nos tentáculos da miúda, e ela passava a controlar toda a situação? È isto que acontece em "Hard Candy".

O filme começa com uma conversa na net, onde a miúda combina com ele um simples encontro. Passado uns segundos estão no café a conversar animadamente,até chegarem a casa dele. De início nós até achamos que o rapaz pode ser alguém perfeitamente inocente: ok leva a miúda para casa dela, mas também é essa miúda que o vai comandando, quase que o obriga a fazê-lo. Embora saibamos de antemão que aquilo tem aspecto de engate pedófilo ( afinal ela tem 14 anos e ele terá por volta de uns 30 anos), não temos essa total consciência. Isso vai surgindo à medida que os acontecimentos vão avançando, em que novas descobertas vão sendo feitas, e novos dados surgirão. Afinal o homem é mesmo o mauzão de um pedófilo, e a rapariguinha é...bem talvez não seja tão inocente quanto isso. Afinal droga o pedófilo e prende-o a uma cadeira, obtendo o total controlo da situação. Ah, e ainda se encarrega de o torturar, e fazer-lhe daquele engate pedófilo, num verdadeiro inferno.

De realçar também que, numa funcional economia de tempo, o realizador David slade deixa-se de rodriguinhos, e enfia logo as personagens uma contra a outra, como que despachando a possível introdução. Ele sabe que é no confronto entre as duas mentalidades, entre aquilo que a rapariga dominadora vai dizendo ao pedófilo, e aquilo que ele acaba por confessar, que o filme ganha maior dimensão. Nisso e no óbvio conflito moral que esta conjuntura vai criar no espectador: afinal a miúda, supostamente inocente, com um capuzinho de capuchinho vermelho, tortura e violenta aquele homem. Ela não surge inocente a nossos olhos: bem pelo contrário. O que o filme consegue fazer é como que vitimizar o pedófilo , autêntica marioneta nas mãos da miúda doida e com uma forte necessidade de apoio psiquiátrico... mas por outro lado é um pedófilo e merece castigo. Há um limiar de pena vs justiça que se ergue, e que nos bloqueia totalmente a possibilidade de estarmos de um dos lados. Ambos são vítimas, ambos são culpados. A miúda é doida e quer-lhe lixar a vida toda, mas o gajo é pedófilo... Como raio vamos sair deste imbróglio? Podemos sentir pena de um pedófilo? Mas...porra o gajo molesta miúdas!

Está mais que claro que é esta possibilidade de ambos serem vítimas e ambos serem vilões que carrega o filme todo às costas, e o permite passar largamente de alguma banalidade dentro do terror psicológico. De qualquer forma existem fragilidades: temos a personagem de Sandra Oh, como vizinha do pedófilo, que está ali a fazer figura. Talvez o maior erro do filme tenha sido precisamente a inclusão desta mulher sensaborona.Depois, há certos diálogos em que a miúda tem saídas bastante previsíveis, bem como algumas das suas acções. Por outro lado, a nível mental, a miúda parece mesmo mais velha. È verdade que o próprio pedófilo lhe diz isso mas...bem, afinal nós nunca chegamos a saber de facto quem ela é. Onde vive.Com quem vive. A miúda foi uma aura terrorífica que ali passou, e logo se desvaneceu, confrontando o pedófilo consigo próprio.

Concluindo e resumindo: "Hard candy" é um filme que consegue surpreender. Primeiro tem os ingredientes mais fortes de um filme deste tipo: poucos personagens, um espaço fechado, e os caracteres de cada um que chocam na perfeição. depois a miúda parece a encarnação do mal, com tudo o que isso acarreta, entrando na mente do pedófilo,sugando tudo aquilo que quer dele. Que é mesmo muito.Ah, e ainda falar do óptimo argumento que conseguiu criar aquele conflito moral na nossa cabeça....conflito esse que vai continuar a permanecer assim que metemos o rabo fora da sala de cinema.

Por isso...se acham que os pedófilos devem ser todos queimados num forno a assar, vejam "hard candy". Das duas uma: ou saem a meio do filme danados por não conseguirem condenar o pedófilo na totalidade, ou então ficam e põem essa mona a funcionar, deleitando-se com intrigante jogo psicológico. È capaz de ser o melhor.


7/10

3 Comments:

Blogger gonn1000 said...

Com tantos elogios, tenho mesmo que ir espreitar isso, até porque a premissa parece criativa q.b.

2:39 PM  
Blogger João D. said...

exactamente, a premissa consegue ser extremamente criativa, e o argumento é muito acutilante em colocar ao espectador o conflito moral: acabamos por achar péssimo aquilo que a miúda faz ao pedófilo, mas depois ficamos com problemas de consciência em achá-lo. Afinal é um pedófilo. È um misto de emoções que o filme consegue obter, e que o torna tão interessante.

Vai ver que vale e pena como já és capz de ter reparado pela minha crítica.

2:11 AM  
Blogger Joana C. said...

Também gostei e concordo plenamente quando dizes que a Sandra Oh não está lá a fazer nada,lol.

12:41 PM  

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