Borat: Cultural Learnings of America for Make Benefit Glorious Nation of Kazakhstan (Larry Charles 2006)
Finalmente!, é caso para dizer. Já era suposto ter ido ver este "Borat" há um bonito porradão de tempo. Porquê? Sobretudo pela total celeuma que causou no seio dos críticos nacionais. E pelo incomensurável apoio de gente como Nuno Markl, ou Filipe homem fonseca. Assim ao longe, parecia-me que "Borat" estava totalmente destinado a ser um daqueles filmes de extremos: ou um gajo fica todo maluco, como o pseudo-produtor do pseudo-comentário, do pseudo-repórter cazaquistanês(ter repetido "pseudo" três vezes confere prestígio não acham?), ficou ao ver a bonita revista da "baywatch", ou então em fúria(mesmo que contida) do povo americano a ver o simpático rodeo tão tipíco.
Antes de ser uma comédia "Borat" é um filme sobre um tipo qualquer, vindo de um país do seilaonde, à grande metrópole. À terra dos esclarecidos, dos "iluminados" que pensam ser donos da razão, que pensam que o mundo seria perfeito se toda a gente fosse simplesmente "americanizada". È mais ou menos isto que uma das anfitriãs daquele genial jantar diz, quando borat vai à casa de banho, e é mais ou menos isto que parecem pensar todos aqueles que se cruzam com o repórter cazaquistanês. Aliás, a própria aceitação da personagem de Borat pelo exterior do cazaquistão, tem precisamente a ver com o facto de que não interessa de onde borat vem: é um país qualquer alternativo no meio da Àsia, alternativo o suficiente para ninguém se preocupar com isso. E Sacha Baron Cohen, o génio por detrás de "Borat" sabe isso melhor que ninguém.
Vamos então ao (simples) enredo de "Borat". Cohen, personifica a personagem que ganhou notoriedade tanto no "ali g show", como na apresentação dos "mtv european music awards" no nosso simpático cantinho. Borat é mandado pelo ministério da informação do Cazaquistão para efectuar um documentário sobre os hábitos de vida dos americanos, com o intuito disso poder trazer algum benefício ao país asiático. Ou seja, tentar aplicar o que de bom Borat possivelmente verá naquela que é a grande nação do mundo, a dita enorme metrópole. O problema é que quando chega aos "U.S and A" vê um episódio de "baywatch" na televisão e apaixona-se por Pamela Anderson...
E o início, com a população que parecia viver da agricultura, com as vacas dentro de casa, os carros a serem puxados pela carroça, entre outros simpáticos mimos, denotam precisamente a total indefinição cultural que, supostamente, o Cazaquistão está a viver. A necessidade de ter uma guia, um ponto de ajuda, vindo daquele que será possivelmente o país modelo, para tantas almas pouco esclarecidas. Borat goza com todo o suposto arcaísmo, goza com os preconceitos de toda a gente(sobretudo dos americanos) face aos países desconhecidos, exagerando na caricatura, para nos arrancar uma boa piada. Porque, mais que tudo, "Borat" é sobre o ocidente: personificado através dos Estados Unidos.
O grande problema de toda a gente que criticou negativamente "Borat", é pura e simplesmente não ter arcaboiço suficiente para perceber que o filme está muito longe de ser linear: é ficar chocado com algumas das cenas mais fortes(e também mais cómicas), e depois esquecer toda a mensagem subliminar, porque "há muitas piadas escatológicas". E a seguir vem-se com a bonita desculpa dos "apanhados", quando todas as situações, são justificadas, com a plena necessidade de Borat ter de assimilar a cultura norte-americana. Daí que vai falar com gente importante, passando por pessoas mais abastadas, gays, prostitutas, jovens americanos brancos e negros, conservadores, feministas. Todo um rol de gente que é colocado em causa, precisamente pela falta do direito à diferença.
"Borat" é um filme de culturas: é um filme que fala, sobre a nosa intolerância face àquilo que desconhecemos. E Sacha pega nessa intolerância e transforma-a em momentos de puro deleite. E, como uma sanguessuga, acaba por chupar todas as falhas dos próprio sistema americano. È criticar o melting pot que se acha muito liberal,muito diverso, mas que não aceita uma pessoa chamada por borat(uma suposta prostituta, numa das sequências mais cómicas do filme), ou determinados modos orais que borat aprende com o povo nigga lá dum qualquer sítio,e depois os vai aplicar num hotel de charme.
E o grande problema é que nós antecipamos as piadas: sabemos que ele vai ser expulso do hotel. Sabemos que ,com a prostituta, borat vai ser facilmente expulso daquele jantar tão cheio de etiqueta e tão "americanizado". E sabemos que, ao falar de Pamela e ao dizer barbaridades como " o cérebro da mulher não é maior que o de um esquilo" as feministas lhe vãodar um pontapé no rabo. Nós somos todos aqueles que não toleramos os outros. Mesmo quando existe um excesso. Mesmo involuntariamente.
Por isso, "Borat" é muito mais que uma comédia: para além de nos fazer rir que nem uns doidos(porque Sacha sabe perfeitamente quando é que há de meter ali uma boa piada), também nos alerta para uma sociedade demasiadamente fechada no seu próprio umbigo. E tudo isto embalado numa exímia realização de Larry charles, que já realizou episódios de "Seinfeld" e "curb your enthusiasm" penso eu de que. Exímia porque dá a plena noção de documentário, de pitoresco, de kitsh em milhentas situações. Depois Sacha é realmente um enorme actor, porque para além de timing e de uma deliciosa lata do caraças também torna absolutamente credível e real a personagem chamada Borat.
E parece-me sinceramente, que é por ser tão real, tão credível, que "borat"- o filme, foi proibido tanto pelo governo cazaque, como pelos russos. Não que Sacha seja credível enquanto cazaquistanês: isso não será com certeza. Mas a personagem é tão boa, que alguém menos informado pode perfeitamente ficar coma ideia errada do país. Mas para Sacha isso pouco importa: já que o ocidente está tão fechado em si mesmo, que não se vai preocupar em perceber se borat pode existir de facto ou não.
"Borat:Cultural Learnings of America for Make Benefit Glorious Nation of Kazakhstan", é um grande filme. Mesmo. Consegue, com muitas piadas algumas mais fáceis é certo mas sempre brilhantes e bem tiradas, retratar-nos, e consegue gozar connosco. E nós, feitos parvos, rimo-nos com nós mesmos. E se os EUA tiveram um far-play tão grande em relação ao filme(a crítica foi quase unânime ao aclamar "Borat"), porque raio é que nós não tivemos? Seremos ainda assim tão púdicos? Só pode ser isso.
"Borat" é genial. Acabou a conversa.
9/10
4 Comments:
Granda Filme!!! Adorei!!! A parte do hotel foi mesmo inesperada!!! lolol
Gostei da crítica, defendeste bem o filme, mas só concordo em parte. Acho que há por ali cenas desnecessárias, irreverentes e excêntricas só porque sim, sem propósito. Por vezes acerta, mas também falha em igual medida. Genial? Não, mas também não é o atentado que muitos dizem, fica-se pela mediania.
Gonn, algumas cenas talvez tivessem ido ao extremo do exagero. Mas calculo que o que o sacha quereria fazer era pura e simplesmente "chocar" o ocidente que costuma ser tão púdico e tão virado para a etiqueta. Colocar á algumas cenas mais "excêntricas", só pode servir para o borat gozar ainda mais connosco, chamando-nos aquilo que referi acima..e para voltarmos a rir de nós próprios.
Pelo menos foi a ideia com que fiquei...e gostei muito do filme, porque ele consegue dizer muito de nós, através de um indivíduo completamente estereotipado, criado através de preconceitos da sociedade ocidental.
Olá João. Muito boa a crítica, apesar de eu não ter podido entender algumas das expressões lusas.
Aqui no Brasil a impressão sobre "Borat..." foi a mesma. Mas ainda acho que escolher o Cazaquistão como bode-espiatório (algo como "alvo frágil") é dispensável e fere muito a auto-estima de um país já caricaturado e mal visto (mesmo que não importe, já que os maus observadores sejamos nós, ocidentais egocentricos).
Espero continuar lendo opiniões do além-mar.
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